O café, uma das bebidas mais consumidas globalmente, é conhecido por seus efeitos estimulantes, principalmente devido à cafeína. No entanto, pesquisas recentes têm revelado que o café, especialmente o café arábica, oferece uma gama de benefícios que vão além do simples despertar, impactando positivamente a saúde cerebral a longo prazo.
Como o Café Arábica Atua no Cérebro?
Cafeína e Neurotransmissores
A cafeína, o componente mais estudado do café, atua como um antagonista dos receptores de adenosina no cérebro. A adenosina é um neuromodulador que promove o relaxamento e a sonolência. Ao bloquear esses receptores, a cafeína impede a ação da adenosina, resultando em:
•Aumento do estado de alerta: Reduz a sensação de fadiga e melhora a vigília.
•Melhora da concentração e foco: Facilita a atenção sustentada em tarefas cognitivas.
•Liberação de neurotransmissores: Estimula a liberação de dopamina, norepinefrina e acetilcolina, que são cruciais para o humor, motivação e funções cognitivas.
Compostos Bioativos e Neuroproteção
Além da cafeína, o café arábica é rico em uma variedade de compostos bioativos, como polifenóis (ácidos clorogênicos e cafeico), alcaloides (trigonelina) e diterpenos (cafestol e caweol). Esses compostos contribuem para os efeitos neuroprotetores do café através de diversos mecanismos:
•Ação antioxidante: Combatem o estresse oxidativo, que é um fator chave no envelhecimento cerebral e no desenvolvimento de doenças neurodegenerativas.
•Redução da neuroinflamação: Diminuem a inflamação no cérebro, que pode levar a danos neuronais.
•Modulação da plasticidade sináptica: Melhoram a capacidade das sinapses (conexões entre neurônios) de se fortalecerem ou enfraquecerem ao longo do tempo, o que é fundamental para a memória e o aprendizado.
•Proteção contra doenças neurodegenerativas: Estudos epidemiológicos e experimentais sugerem que o consumo regular de café pode reduzir o risco de desenvolvimento de doenças como Alzheimer e Parkinson. Isso se deve, em parte, à capacidade do café de proteger os neurônios dopaminérgicos e inibir a formação de placas beta-amiloides.
Benefícios Específicos para o Cérebro
•Melhora da memória: A cafeína pode influenciar positivamente a memória de trabalho e a consolidação da memória de longo prazo, especialmente em tarefas que exigem atenção.
•Aumento do humor: A liberação de dopamina e serotonina pode contribuir para a melhora do humor e a redução do risco de depressão.
•Redução do risco de AVC: Alguns estudos indicam que o consumo moderado de café pode estar associado a um menor risco de acidente vascular cerebral.
•Aumento da resiliência cognitiva: O consumo regular de café pode ajudar a construir uma base sólida para a resiliência cognitiva, protegendo o cérebro contra o declínio relacionado à idade.
É importante ressaltar que os benefícios do café para o cérebro são observados com um consumo moderado (geralmente de 3 a 5 xícaras por dia). O consumo excessivo pode levar a efeitos adversos, e indivíduos com certas condições de saúde devem consultar um profissional antes de aumentar a ingestão de café.
Ação da Cafeína em Detalhes
A cafeína (1,3,7-trimetilxantina) é um alcaloide que exerce seus efeitos estimulantes principalmente através do antagonismo dos receptores de adenosina A1 e A2A no sistema nervoso central. A adenosina é um nucleosídeo endógeno que se acumula no cérebro ao longo do dia, promovendo a sonolência e diminuindo a atividade neuronal. Ao se ligar a esses receptores sem ativá-los, a cafeína impede que a adenosina exerça seus efeitos inibitórios. Isso leva a um aumento na liberação de neurotransmissores excitatórios como a dopamina, norepinefrina e acetilcolina, que estão envolvidos na regulação do humor, atenção, aprendizado e memória.
Além disso, a cafeína pode influenciar a liberação de outros neurotransmissores e neuromoduladores, como a serotonina e o GABA, contribuindo para seus efeitos complexos no cérebro. A melhora na concentração e no tempo de reação observada após o consumo de café é um reflexo direto dessa modulação da atividade neuronal.
O Papel dos Compostos Bioativos Além da Cafeína
O café arábica é uma fonte rica de diversos compostos bioativos que atuam sinergicamente para promover a saúde cerebral. Entre eles, destacam-se:
•Ácidos Clorogênicos (ACGs): São os polifenóis mais abundantes no café e possuem potentes propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. Eles podem atravessar a barreira hematoencefálica e exercer efeitos neuroprotetores diretos, protegendo os neurônios contra danos oxidativos e inflamatórios [2]. Além disso, os ACGs podem modular a microbiota intestinal, que por sua vez influencia a saúde cerebral através do eixo intestino-cérebro.
•Cafestol e Caweol: São diterpenos presentes no café não filtrado. Embora conhecidos por seu impacto no colesterol, estudos recentes sugerem que também possuem propriedades anti-inflamatórias e neuroprotetoras, contribuindo para a proteção contra doenças neurodegenerativas [3].
•Trigonelina: Um alcaloide que, além de contribuir para o sabor do café, tem demonstrado potencial neuroprotetor, especialmente na prevenção de danos neuronais e na promoção da neurogênese (formação de novos neurônios) [4].
Impacto na Saúde Mental e Doenças Neurodegenerativas
O consumo regular de café tem sido associado a um menor risco de desenvolvimento de várias doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer e a doença de Parkinson. Acredita-se que os mecanismos envolvidos incluam a redução da neuroinflamação, a proteção contra o estresse oxidativo, a modulação da sinalização de dopamina e a inibição da agregação de proteínas anormais, como a beta-amiloide no Alzheimer e a alfa-sinucleína no Parkinson.
Além disso, o café pode ter um impacto positivo na saúde mental, com estudos sugerindo uma associação entre o consumo moderado de café e um menor risco de depressão e ansiedade. A melhora do humor pode ser atribuída à modulação de neurotransmissores como a dopamina e a serotonina, que desempenham um papel crucial na regulação do humor.
Referências
[1] Nehlig, A. (2010). Caffeine and the central nervous system: mechanisms of action, biochemical, metabolic and psychostimulant effects. Brain Research Reviews, 62(2), 215-225. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S016501700900092X
[2] Socała, K., Szopa, A., Serefko, A., Poleszak, E., & Wlaź, P. (2020). Neuroprotective Effects of Coffee Bioactive Compounds: A Review. International Journal of Molecular Sciences, 22(1), 107. https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC7795778/
[3] Wierzejska, R. (2017). The impact of coffee consumption on the occurrence of selected diseases. Roczniki Państwowego Zakładu Higieny, 68(1), 1-10. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8210408/
[4] Kim, J., Lee, S., & Kim, J. (2017). Trigonelline: A plant alkaloid with diverse pharmacological properties. Molecules, 22(9), 1413.